Saturday, May 01, 2010

Revolta.



Eu costumava me achar especial.
Sim, especial como alguém abençoada por Deus que, nesse mundo, sofre injustiças e trapaças, apenas para ultrapassar a si mesma, e mostrar ao mundo como se viver plenamente, com bondade e amor pelo próximo. Quase uma espécie de novo Jesus Cristo.
Com o tempo, as trapaças e injustiças tornaram-se parte do meu dia-a-dia. E, devo admitir, ainda hoje é difícil suportá-las com dignidade e honra. A bebida acaba sendo sempre meu melhor consolo e único braço amigo. Um braço tão útil que conforta e mata ao mesmo tempo.
Eu costumava ter amigos. Sim, e pensava, inclusive, que eles também apreciavam a minha presença. Ah, eu também tinha namoradas. E bom, apesar da minha insegurança, também pensava que elas me amassem. Hoje eu sei que vivia de ilusões. Ilusões de amor fraternal, amor romântico e até mesmo amor vindo de desconhecidos. Eu pensava emitir carisma e luz por onde quer que eu passava.
Deus, se eu pudesse voltar atrás. Olhando a minha vida, como quem rebobina um filme, percebo a quão estúpida e cega eu era. Todas as situações pelas quais eu passei e todas as coisas que eu fiz, para ser simplesmente ignorada. Para ser apenas um incômodo ambulante perambulando por corredores e acenando feliz e inutilmente para as pessoas.
A partir de amanhã, mudarei a minha vida. Ou melhor, mudarei o mundo!
Sim, senhores! Serei rainha nesse mundo de plebeus. Mostrarei as pessoas o poder da minha maldade reprimida e dominarei as almas perdidas e gananciosas que se apossaram de toda a minha bondade excessiva. Oh, sim. Não haverá mais lugar para os egoístas e hipócritas no meu mundo de luz e calor. Não haverá mais lugar para amigos e namoradas que ignoraram suas amadas. Não haverá espaço para tristeza e decepção. Nunca mais. Ouvirei o grito dos aflitos e desesperados e torná-los-ei príncipes e princesas de uma nova Era.
Mas isso eu deixarei para amanhã.
Hoje ainda preciso arrumar a casa da minha amiga que, coitada, está doente e passa o dia deitada na cama, assistindo aos programas matinais na televisão. Pobrezinha, preciso ajudá-la.