Tuesday, September 30, 2014

Socorro



As pessoas reagem de formas diferentes às perdas. Eu tenho minha forma de reagir: eu volto ao passado e me torno o que costumava ser. Esse ano tive muitas perdas: perda da auto estima, do orgulho, do capital, das oportunidades e, por pouco, a perda da minha base vital. Cada um reage a sua forma às perdas. E eu estou piorando. Estou tentando pedir socorro. Voltei a fazer todas aquelas coisas que eu sempre soube que não deveriam ser feitas. Os cortes, a forca, os remédios, a bebida... nada é capaz de me acalmar. Eu preciso de ajuda, sei que estou doente, mas não sei como pedir ajuda. Preciso me libertar de todos esses pesares e fracassos. Sei que existem outras possibilidades mas estou cansada demais para tentar. Me sinto tão infinitamente triste. Tão sozinha e abandonada. Me sinto abandonada até pela minha sorte e pelos meus protetores. Parece que eles também desistiram de mim. Parece que todo mundo desistiu de mim. Estou reduzida à minha invisibilidade. Não consigo reagir à tantos golpes. Cada pancada levou um pouco do que eu tinha construído, levou um pouco de quem eu era. Talvez seja o momento de parar de lutar contra o mundo e me unir à ele. Talvez seja o momento de desistir de mim mesma também... 

1 comment:

Anonymous said...

Se a descida se faz assim, em certos dias, na dor, pode também fazer-se na alegria. Esta palavra não é de mais. Ainda imagino Sísifo voltando para o seu rochedo, e a dor estava no começo. Quando as imagens da terra se apegam de mais à lembrança, quando o chamamento da felicidade se torna demasiado premente, acontece que a tristeza se ergue no coração do homem: é a vitória do rochedo, é o próprio rochedo. O imenso infortúnio é pesado de mais para se poder carregar. São as nossas noites de Gethsémani. Mas as verdades esmagadoras morrem quando são reconhecidas. Assim, Édipo obedece de início ao destino, sem o saber. A partir do momento em que sabe, a sua tragédia começa. Mas no mesmo instante, cego e desesperado, ele reconhece que a único elo que o prende ao mundo é a mão fresca de uma jovem. Uma frase desmedida ressoa então: “Apesar de tantas provações, a minha idade avançada e a grandeza da minha alma fazem-me achar que tudo está bem”. O Édipo de Sófocles, como o Kirilov de Dostolevsky, dá assim a fórmula da vitória absurda. A sabedoria antiga identifica-se com o heroísmo moderno.

Não descobrimos o absurdo sem nos sentirmos tentados a escrever um manual qualquer da felicidade. “O quê, por caminhos tão estreitos?...”. Mas só há um mundo. A felicidade e o absurdo são dois filhos da mesma terra. São inseparáveis. O erro seria dizer que a felicidade nasce forçosamente da descoberta absurda. Acontece também que o sentimento do absurdo nasça da felicidade. “Acho que tudo está bem”, diz Édipo e essa frase é sagrada. Ressoa no universo altivo e limitado do homem. Ensina que nem tudo está perdido, que nem tudo foi esgotado. Expulsa deste mundo um deus que nele entrara com a insatisfação e o gosto das dores Inúteis. Faz do destino uma questão do homem, que deve ser tratado entre homens. Toda a alegria silenciosa de Sísifo aqui reside. O seu destino pertence-lhe. O seu rochedo é a sua coisa. Da mesma maneira, quando o homem absurdo contempla o seu tormento, faz calar todos os ídolos. No universo subitamente entregue ao seu silêncio, erguem-se as mil vozinhas maravilhadas da terra. Chamamentos inconscientes e secretos, convites de todos os rostos, são o reverso necessário e o preço da vitória. Não há sol sem sombras e é preciso conhecer a noite.